2011  tem tudo para ser o ano 1 do empreendedorismo na internet. De um lado,  milhares de jovens brasileiros criativos e ávidos por ganhar dinheiro — e  fazer história. Do outro, investidores atentos, de mão e cabeça abertas para  boas ideias. Nunca houve tanta gente interessada em tornar o país a nova nação  das startups. Saiba como entrar na corrida pelo ouro digital — e chegar lá na  frente.
Sérgio Tauhata e  Thiago Cid 
A euforia em torno  do tema no Brasil envolve outros fatores além do fenômeno Zuckerberg. Tem mais  a ver com os nossos próprios ‘jovens gênios’, a exemplo do paulista Romero  Rodrigues, que fundou o site de comparação de preços Buscapé em 1998. A venda  da empresa pela espetacular soma de US$ 342 milhões ao grupo de mídia  sul-africano Naspers, há cerca de dois anos, pode ser considerada como marco  de estímulo ao empreendedorismo digital no país. Mais recentemente, coube ao  carioca Julio Vasconcellos, cofundador do site de compras coletivas Peixe  Urbano, inspirar o sonho de sucesso dos brasileiros. “Ter heróis nacionais é  um dos mais poderosos fatores de motivação para quem quer abrir um negócio  próprio”, diz Allen Taylor, diretor de Redes Internacionais da Endeavor,  principal ONG de apoio ao empreendedorismo no mundo. 
Heróis não  existiriam, claro, não fossem os bons ventos que sopram em favor das empresas  digitais no país. Há aproximadamente 15 anos, o acesso de 1 Mbps custava  espantosos R$ 22 mil ao mês. Hoje, não mais que R$ 50. O barateamento de  recursos, tanto de hardware como de software, o crescente acesso da classe C à  tecnologia, a expansão da banda larga, as recentes aplicações na nuvem (que  eliminaram a obrigatoriedade de uma empresa ter data center, por exemplo) e  até o anúncio da fabricação do iPad no interior de São Paulo têm construído um  cenário tão favorável às start¬ups que não seria exagero afirmar que 2011 é o  ano um da nova internet brasileira. 
Embora paire certa  incerteza sobre a solidez dos negócios virtuais no mundo, a exemplo da  desconfiança do mercado em relação à oferta inicial de ações do LinkedIn, o  Brasil segue em curva ascendente. É um panorama completamente diverso daqueles  que chegaram a ser chamados de primeira e segunda ondas digitais das décadas  anteriores: a fase de simples reprodução de negócios americanos bem-sucedidos  e a de outsourcing, ou terceirização dos serviços de tecnologia da informação  (TI). 
Senão, vejamos. A  unidade brasileira da Endeavor resolveu lançar neste mês um concurso exclusivo  para empresas digitais. A intenção é selecionar dez empreendedores, nem mais  nem menos, que terão a oportunidade de apresentar seus negócios a investidores  e especialistas do mercado para receber valiosos conselhos em relação aos seus  modelos de negócio. Uma importante nota de corte é o faturamento, que deve se  situar entre R$ 200 mil e R$ 5 milhões. Ou seja, todas as candidatas devem ser  de pequeno e médio portes e ter grande potencial de crescimento. E por que  criar um concurso à parte, e não inseri-lo no recrutamento já tradicional que  a entidade promove em busca dos chamados empreendedores de alto impacto? Quem  responde é o presidente da Endeavor no Brasil, Rodrigo Telles: “O bom momento  da economia brasileira trouxe ao país uma série de investidores dispostos a  apostar nas nossas startups. Grande parte dos recursos está direcionada agora  para esse setor”. 
Para quem teve a  oportunidade de estar em um domingo de sol na Faculdade de Informação e  Tecnologia (FIAP), no bairro do Cambuci, em São Paulo, ou no Pão de Açúcar, no  Rio, no comecinho de maio, não resta dúvida de que existe algo realmente novo  no ar. As duas cidades serviram como escalas obrigatórias do Geeks on a Plane,  projeto internacional que tem por objetivo o saudável intercâmbio entre  empreendedores e investidores do Vale do Silício, da Califórnia, e seus pares  no mundo. Criado pelo investidor americano Dave McClure, dono de um fundo que  já investiu em nada menos que 500 startups, o programa trouxe 50 geeks  americanos e reuniu uma plateia de cerca de 250 interessados na capital  paulista e outros cem na fluminense. “O que torna o país de vocês especial  neste momento é o potencial enorme de crescimento: são milhões de pessoas  falando a mesma língua à espera de produtos e serviços de qualidade”, disse  McClure. “Os empreendedores brasileiros têm de acordar para o fato de estarem  em vantagem em relação aos americanos por uma questão simples: eles têm o  domínio natural da língua, da cultura e dos hábitos de consumo do país”. 
Atentos às palavras  de McClure, munidos de tablets, netbooks e smartphones, falando apenas em  inglês, e com seu típico visual antiterno e gravata, os geeks ficaram  concentrados por horas em torno de temas como seed capital, anjos,  crowdfunding, bootstrapping, crowdsourcing (veja glossário à página 69). O  clima era de absoluta informalidade. Na rápida pausa para almoço do evento em  São Paulo, os participantes tapearam a fome com salgadinhos e aproveitaram ao  máximo o tempo para conversar com os gestores de fundos, que se sentaram em  bancos de metal, em torno de pequenas mesas, para esclarecer milhares de  dúvidas dos empreendedores brasileiros. 
Um dos presentes  era Anibal Messa, primeiro investidor do Buscapé, hoje na liderança do fundo  de venture capital Temasek, de Cingapura. “Lentamente, estamos criando uma  cultura em que o empreendedor passa a ser visto como alguém que constrói, e  não um maluco irresponsável, como até pouco tempo atrás. Os brasileiros eram  educados para serem funcionários públicos, médicos ou advogados. Hoje, não  mais”, diz. “Mas me preocupa isso virar modinha. Muita gente saiu de seus  empregos e apostou em empresas que não foram bem pensadas”, afirma. 
Como já assistiram  a um filme bem menos divertido que o recente A Rede Social, que conta a  história da fundação do Facebook do ponto de vista do brasileiro Eduardo  Saverin, cofundador da empresa, os investidores aprenderam a observar as  startups sob mais pontos de vista. Os gestores de fundos têm deixado cada vez  mais claro que não estão interessados só nas pessoas jurídicas, e sim nas  físicas. “Apostamos o nosso dinheiro é nas pessoas”, disse o americano Tim  Haley, sócio do fundo Redpoint Ventures, de passagem pelo Brasil a convite da  Endeavor. O “geek ideal”, seja de que nacionalidade for, tem vários  denominadores em comum, segundo os investidores: flexibilidade, domínio do  assunto, ambição, transparência, capacidade de correr riscos e visão de longo  prazo. Entre os fatores intangíveis, a preconizada “paixão pelo negócio”  aparece no topo da lista de qualidades procuradas. Sócio do fundo inglês  Balderton Capital, o italiano Roberto Bonanzinga deu uma importante dica a  quem pensa em montar um negócio com a turma da faculdade: “Duas cabeças pensam  melhor que uma. Mas três podem ser demais, e gerar conflitos. Os investidores  têm de ter certeza que a equipe não vai se desfazer em pouco tempo”. O  consultor Eric Müller, da Kauffman Fellows Program, respeitado centro de  ensino para executivos de venture capital dos Estados Unidos, diz que o tal  brilho nos olhos conta, sim, mas o que pesa mesmo na decisão é a capacidade  que o empreendedor tem de explicar sua ideia. “Fundos querem objetividade”,  diz. No entanto, cada fundo, seja de que tamanho for, parece colocar suas  próprias idiossincrasias à mesa na hora de decidir em quem apostar (veja uma  galeria de investidores à página 68). Cassio Spina, da São Paulo Angels, faz  uma autocrítica: “Um dos nossos problemas é só investir em mercados  conhecidos”. 
Mas o Brasil ainda  tem algumas outras questões para resolver, se tiver a ambição de se tornar uma  “startup nation” — a alcunha que Israel conquistou nos anos 2000, depois de  uma força-tarefa de incentivos públicos e privados que resultaram no  florescimento das empresas digitais do país. Enquanto no Brasil o “Geeks on a  Plane” foi um evento prestigiado por iniciados, no Chile eles contaram com a  fervorosa recepção do presidente Sebastian Piñera (veja box na página ao  lado). Nos Estados Unidos, dados da Kauffman Foundation mostram que o número  de startups criadas entre 2007 e 2009 foi o mais elevado em 14 anos, superando  o boom dos anos 1999/2000. A pesquisa revela ainda que 40% dos jovens  americanos entre 18 e 24 anos têm a intenção de empreender. No Brasil, de  acordo com a última pesquisa do Global Entrepreneurship Monitor (GEM), esse  número ainda é de 17,3% 
Quem compareceu à  quarta edição da Campus Party, evento digital que mobiliza milhares de geeks,  em São Paulo, e os viu acampados por seis dias inteiros em um mar de  barraquinhas e computadores, sabe que o Brasil tem potencial de sobra para  fabricar startups de sucesso. Nas próximas páginas, apresentamos um painel de  empresas lideradas por 45 brasileiros. Eles foram selecionados pela revista  Pequenas Empresas & Grandes Negócios com a ajuda de professores,  investidores e entidades especializadas em internet. É gente que tem tudo para  fazer história — e, quem sabe, se tornar lenda tão importante quanto McCartney  e Zuckerberg. 

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